Infância e pós-estruturalismo

Anete Abramowicz, Gabriela Tebet

R$50.00

APRESENTAÇÃO

Esta é a 2ª edição do livro Infância e Pós-Estruturalismo, originalmente publicado em 2017. A obra foi ampliada, de modo a incorporar dois excelentes e essenciais artigos: um sobre René Schérer, escrito por Silvio Gallo e um sobre infâncias e pós-colonialismo, escrito pela pesquisadora indiana, Sarada Balagopan. Esta nova edição do livro é resultado de um conjunto de encontros e pesquisas que vêm sendo promovidos por grupos de pesquisadoras e pesquisadores nacionais e internacionais em torno dos temas da criança, do bebê, da infância, dos “Estudos da Infância” sob a analítica pós-estruturalista e pós-colonialista, com o intuito de combater o colonialismo e o racismo que habitam as estruturas sociais e as subjetividades, de maneira a forjar resistências e produzir diferenças de toda ordem.

A filosofia pós-estruturalista ou da diferença

não considera a diferença um problema, mas sim ponto de partida para criar problemas e, assim: problematizar a Escola, O Movimento Social, O Indivíduo, O Coletivo. Um pensamento que não procure as identidades entre o nome e a coisa, mas que invente novas possibilidades a cada vez, que abdique do artigo definido maiúsculo e dos grandes temas que o acompanham. Menos consciência, autonomia, comunicação, informação, bildung[1], reprodução. E mais cartografias, linhas, fugas, singularidades, devires. Pensar a educação, a cultura, a subjetividade nessas condições? É como o equilibrista de Zaratustra que, à beira da morte, ouve o seguinte: “[…] fizeste do perigo o teu ofício” (NIETZSCHE, 2011, p. 20). Uma filosofia que se arrisca a partir da diferença é o que encontramos (Barros, et all, 2017).

Nesse sentido, os artigos derivam de pesquisas que focam a pluralização do objeto social da infância, considerando criança e infância como categorias históricas, inventivas e contingentes por meio de suas multiplicidades: raça, classe social, gênero, sexualidade e etnia. Tomamos a multiplicidade da experiência da infância como positividade orientada pelo pensamento da diferença, que se pauta nos referenciais teóricos, em especial, deleuziano e foucaultiano, e nos campos contemporâneos das relações étnico-raciais, de sexualidade e gênero, para os quais as diferenças infletem nossa subjetividade permitindo múltiplas possibilidades de existências, além de agregarmos um repertório pós-colonialista. Compreendemos que a criança se refaz de forma singular em suas diferenças e é na busca de compreender as possibilidades destas singularidades que os grupos de pesquisadores/as realizam suas atividades.

A primeira edição deste livro trouxe às mãos do público alguns dos debates ocorridos em 2015 quando da realização do 4o Seminário Internacional, realizado na Universidade Federal de São Carlos, que teve como tema central “Educação Infantil e Pós-Estruturalismo”. Este seminário buscou articular temas ligados à infância e à educação infantil, a partir de algumas das contribuições desta perspectiva filosófica que tem como alguns de seus principais pensadores os filósofos Michel Foucault, Gilles Deleuze, Félix Guattari, isto é, autores que possuem uma significativa influência do pensamento de Nietzsche. Assim, se Nietzsche é uma espécie de ancestral dessa Filosofia da Diferença, é com um de seus primeiros pensadores que esse pensamento ganhou impulso: Gilles Deleuze.

Os debates que integram essa obra mobilizam, sobretudo, temas como devir, diferença, criação, singularidade, experiência, acontecimento, individuação, subjetivação, desterritorialização e reterritorialização, dispositivo, entre outros; e, a partir destes conceitos, são propostos novos olhares para as crianças, para a infância e para a educação.

Agregamos para este livro o artigo da professora indiana Sarada Balagopalan que sob a analítica pós-colonialista que não converge à filosofia da diferença, questiona conceitos centrais estabelecidos pela sociologia da infância, como por exemplo, “agência”, propondo “responsabilidade” como um novo conceito. E também, o artigo de Silvio Gallo que a partir da leitura do pensador René Schérer procura pensar um “modo maior da infância” que implica, segundo Gallo, em um triplo desfazimento de relações societárias construídas na modernidade: trata-se de pensar a infância num movimento de despedagogização, de desfamiliarização, de despsicologização.

Assim, a primeira parte deste novo livro reúne capítulos de: Liselott Mariett Olsson (Universidade de Estocolomo, Suécia), cuja prática pedagógica foi premiada e nos trouxe algumas instigações para pensar uma pedagogia da infância em uma perspectiva pós-estruturalista e Stuart Campbell Aitken (Departamento de Geografia da San Diego State University), que traz reflexões sobre as contratopografias da infância, aquilo que ele denomina como “geografias de berço”. O texto de Silvio Munari parte de sua tese de doutorado, que a partir de relatos que envolvem sua relação com pessoas que poderiam ser classificados como “ingovernáveis”, nos propõe pensar uma “pedagogia ingovernável”. Para esta nova edição, acrescentamos o artigo denominado: “Educação infantil: do dispositivo pedagógico ao “ir junto” com as crianças” de Silvio Gallo (Universidade Estadual de Campinas), que propõe uma virada epistemológica ao se pensar a infância enquanto uma invenção utilizando-se do pensador René Schérer.

Na segunda parte do livro, sobre crianças e infância, o artigo da Gabriela Tebet (Universidade Estadual de Campinas), oferece-nos elementos para uma cartografia da infância, identificando as principais linhas que compõem tal dispositivo; o texto da Sandra Corazza (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), por meio de uma história sobre “as gentes pequenas e o indivíduo” busca trazer elementos para indicar alguns pontos significativos da história da infância e do dispositivo de infantilidade; o capítulo de Gustavo Barros (doutorando em educação no PPGE/UFSCar) nos oferece uma introdução ao pensamento de Gilbert Simondon, destacando suas contribuições para uma pedagogia da educação infantil. O texto de Douglas Ord (pesquisador do conceito de criança e infância na obra de Deleuze, mestre em Humanidades Interdisciplinares pela Laurentian University, Sudbury, Canadá) nos apresenta um mapa de como a ideia “criança” vai se diferenciando ao longo da obra de Gilles Deleuze. Ainda nesta parte agregamos o texto da indiana Sarada Galopan (Professora Associada do Departamento de Estudos da Infância, da Rutgers – Universidade Estadual de Nova Jersey) que revisita vários conceitos da sociologia da infância, debatendo o significado de tomar a infância como plural e rediscute o conceito de agência a partir da perspectiva pós-colonialista, propondo uma virada epistemológica. Além destes textos, Anete Abramowicz (Universidade de São Paulo) apresenta um texto no qual propõe resgatar a infância da qual a Educação Infantil tem se afastado pelo processo de escolarização e gravitação em torno da escola.

Com esta 2ª edição do livro Infância e Pós-Estruturalismo esperamos contribuir com elementos para que cada vez mais seja possível a produção de novas infâncias e novas formas de trabalhar com as crianças. Deleuze expressou com a exclamação que ele retoma de Kierkegaard: “Um pouco de possível, senão eu sufoco”. Mas o possível não existe. Ele é criado pelo acontecimento, é uma questão de vida. Há de se criar possíveis e desejamos que este livro possa contribuir para esse movimento de criação de inúmeros novos possíveis e formas de vidas.

Anete Abramowicz e Gabriela Tebet

Junho de 2019

[1] Bildung – Conceito alemão que se assemelha a Paideia grega, tendo como significado formação, cultura, mas como o conceito tende para o idealismo. A formação se remete a imagem (bild) – a formação do homem a partir da imagem (ideal), que se tem de humanidade.

Ano de lançamento

2019

ISBN

978-85-7993-707-1

Número de páginas

250

Organização

Anete Abramowicz, Gabriela Tebet

Formato